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Eu tenho certeza de que ainda não vi meu filme favorito. Gostaria mesmo de acreditar nisso porque o que me instiga como cinéfilo, o que movimenta minha paixão pelo cinema, além de conhecer tudo o que já foi feito até agora – tudo mesmo -, é imaginar que vem muito mais pela frente. Minha lista de filmes favoritos muda a cada semana, mas não é por isso que eu deixo de fazê-la e refazê-la. Redescobrir filmes antigos é delicioso, conhecer pérolas escondidas talvez seja melhor, ir ao cinema e assistir a um filme que enche teus olhos e conversa com você não tem preço.
Na Liga dos Blogues Cinematográficos, eu encontrei muita gente como eu, que ama cinema, escreve sobre cinema e não tem pudores em listar cinema. E olha que listar qualquer coisa pode ser meio arbitrário, seja sozinho ou no coletivo. Há dez anos, a Liga elege seus filmes favoritos. Talvez só tenha sentido para os integrantes do grupo. Mas talvez colocar os títulos que mais representam este conjunto de pessoas num ranking ajude a fazer outras pessoas assistirem obras que elas nunca pensariam em ver.
Entre o altruísmo e o egoísmo, fico com o caminho do meio. Afinal, eu tenho certeza de que ainda não vi o meu filme favorito. A relação que está neste post não é definitiva, nem parte de estudos científicos, mas da combinação de gostos pessoais. Nossa maior pretensão não é ser a Sight & Sound, mas ver o que nossa mistura dá. E a lista que você lê agora é o que a Liga é agora. O grupo muda, as opiniões mudam, a lista muda. O que continua são essas compulsões malucas que ajudam a manter a Liga há tanto tempo: o amor pelo cinema e a busca por nosso filme favorito.
Chico Fireman

20 . LARANJA MECÂNICA | Stanley Kubrick – 9,23
A jornada do personagem Alex é feita de abusos. Abuso dos outros por ele, assim como por conta do governo que lhe força uma educação deturpada. Por pior que seja o comportamento do jovem, tomar seu livre arbítrio é ainda mais terrível. Kubrick constrói essa reflexão sem perder de vista os diversos contextos sociais que levaram Alex a tomar tanto gosto pelo que o próprio personagem chama de ultraviolência. Tudo com o olhar estético de um gênio, em que cada imagem é linda e significativa.
Vinícius Brandão

19 . TABU | Miguel Gomes – 9,25
A estratégia, aqui, é colocar o melodrama ao fundo, como se fosse um espelho para o espectador olhar e se lamentar. Então, uma voz onipresente guia essa história, contada como antes se contavam as histórias, quando o cinema mudo era cinema e a verdadeira arte do atores era simples interpretação e expressão. Gomes não exagera, não confunde. Conta seu filme aos poucos, da forma mais simples e ingênua, como os grandes autores faziam em preto e branco.
Mauricio Ribeiro

18 . PERSONA | Ingmar Bergman – 9,26
Como um sonho: Persona expõe suas personagens através de monólogos que sugam a nós, espectadores, para dentro da complexidade de um ser humano: seu silêncio, seus sacrifícios e seus maiores pecados. Assombrando e sufocando.
Pips

17 . IMPÉRIO DO CRIME | Joseph H. Lewis – 9,29
Há um momento em O IMPÉRIO DO CRIME que sempre fica na memória quando um gangster é executado e seus assassinos retiram seu aparelho de audição e com isso o filme corta o som e nos dá a experiência da morte em primeira pessoa. Todo O IMPÉRIO DO CRIME é composto de momentos assim. Filme engenhoso parceria de invenção entre o diretor Joseph H. Lewis e o fotografo John Alton sempre pronta a nos encantar e surpreender.
Filipe Furtado

16 . OURO E MALDIÇÃO | Erich von Stroheim – 9,29
Afresco naturalista à Emile Zola, onde não faltam os detalhes escabrosos, OURO E MALDIÇÃO, sobre ser uma obra-prima da estética da arte muda, é um filme, no entanto, que configura o universo megalomaníaco e extravagante de um insólito realizador. Falso dentista ganha fortuna, casa-se e, numa noite de embriagues, mata a mulher. Tudo neste filme exala podridão, decrepitude e morte. Mas, estranhamente, de sua fealdade nasce a beleza.
André Setaro

15 . O ESPÍRITO DA COLMÉIA | Víctor Erice – 9,36
Realizado na época da ditadura de Francisco Franco e narrado em tom de fábula, esta obra de Víctor Erice tem na beleza de sua fotografia e na tensa narrativa minimalista, além da doce atuação de Anna Torrent, elementos que o colocam como uma daquelas obras raras de grande apuro técnico e artístico. A trama se passa em uma vila rural afastada durante a segunda guerra mundial onde uma garotinha entra em um mundo de descobertas e fantasia após assistir FRANKENSTEIN (1933) de James Whale.
Wendell Borges

14 . LUZES DA CIDADE | Charlie Chaplin – 9,39
Não há em LUZES DA CIDADE cena tão icônica quanto o passeio pelas engrenagens ou a dança dos pãezinhos. Há Chaplin em sua essência, o vagabundo de olhar inconfundível, aqui confundido com um milionário por uma florista cega por quem se apaixona. A rua, parceria dos filmes de Carlitos, é importante personagem deste que é uma de suas histórias mais aclamadas, exposta em marginalidade, mas esperançosa ao ser povoada por figuras tão especiais quanto o próprio Chaplin.
Edson Burg

13 . TAXI DRIVER | Martin Scorsese – 9,40
Poderia ter sido diferente. DePalma seria o diretor, Griffith e Basinger eram as primeiras opções para o papel de Iris, Fawcett era a favorita dos produtores, Phillips para o papel de Betsy, Herrmann não queria fazer sua trilha e Pacino seria Travis Bickle. Mas dizem por aí que só existe uma maneira perfeitamente correta de se contar uma história no cinema – e assim nasceu o maior conto da patologia da solidão que o cinema já viu, um dos seus maiores anti-heróis e uma história impactante da busca pela redenção.
Ana Clara

12 . O PODEROSO CHEFÃO II | Francis Ford Coppola – 9,43
Muito se fala sobre a importância dos anos 70 para uma geração de cineastas norte-americanos dispostos a retocar a gramática do cinema de grandes estúdios. Dentro dessa ideia (que não deixa de ser uma generalização), é impossível desconsiderar o segundo O PODEROSO CHEFÃO como um dos exemplos mais grandiosos da engenharia complicada que diretores como Coppola e Scorsese praticaram. Talvez por isso mesmo, entre as maiores lembranças que tenho do filme não está ações de personagens ou cenas específicas: mas a imagem da incrível ambição de um cineasta que, com pretensões ao mesmo tempo épicas e íntimas, conseguiu refazer, ampliar, contorcer e expor arestas de uma história que, de alguma forma, ele já havia contado. Como se explodisse o primeiro filme em centenas de cacos, Coppola criou uma obra-prima de fragmentos. Que às vezes até se completam.
Tiago Superoito

11 . CIDADÃO KANE | Orson Welles – 9,43
Rosebud, com um balbuciar de uma palavra, Orson Welles nos ensinou a transformar uma biografia em um filme de suspense delicioso. A ficção nos apresenta um roteiro que desmistifica manuais e utiliza o flashback de maneira criativa e instigante. Da mesma maneira que a utilização da profundidade de campo, do jogo com espelhos, da montagem. Não por acaso, dizem que nada mais foi criado no cinema após CIDADÃO KANE
Amanda Aouad

10 . 2001 – UMA ODISSÉIA NO ESPAÇO | Stanley Kubrick – 9,50
Inovador pela sua estética e efeitos, esta obra-prima é um dos filmes mais complexos do cinema. Kubrick nos conduz a uma viagem visual, com direito a uma elipse de quatro milhões de anos, pela evolução humana. Marcante pelo uso da música como elemento inseparável da narrativa e minimizando diálogos, 2001 – UMA ODISSÉIA NO ESPAÇO é uma experiência subjetiva, um filme mais para se sentir do que para se entender.
Mila Ramos

9 . O PODEROSO CHEFÃO | Francis Ford Coppola – 9,50
Da mesma década que nasceu o primeiro filme de certa trilogia que mudou a maneira de se fazer cinema, persiste a influência e poder do primogênito de outra, que é prova de cinema criado e defendido por cineastas autorais, capazes de não ceder a interesses secundários quando tem uma câmera a mão. Somente um criador deste tipo seria capaz de transformar um provável filme bang-bang sobre o declínio da máfia em uma saga sobre a mais sagrada das instituições, a família. Hipnótico sem sangue grátis, sem efeitos e sem sabres de luzes, O PODEROSO CHEFÃO consegue fugir fácil do simples etiquetamento de clássico.
Roger Kiihl

8 . TRÊS HOMENS EM CONFLITO | Sergio Leone – 9,52
Caracterizando para descaracterizar: esta é uma boa definição para TRÊS HOMENS EM CONFLITO. E justo pelo fato do trielo de adjetivos em seu título original (bom, mau e feio) moldarem os personagens do filme por si só, guiando Leone para um conflito de desmitificação de tal ato, impondo os homens como misturas homogêneas perante Deus e a cobiça – nenhum deles é o que parece, salvo pela origem animal e selvageria
Bruno Barrenha

7 . ONDE COMEÇA O INFERNO | Howard Hawks – 9,54
Em RIO BRAVO, o tempo e o lugar não são tão importantes. Nem a história. Aliás, de propósito, Hawks quis fazer o filme sem história bem definida. Trata-se de um filme de personagens. John Wayne aparece, não como sujeito amargo e consumido de ódio como em RASTROS DE ÓDIO, mas como um autêntico herói hawksiano de grande coração, e que deve permanecer duro e inabalável diante das dificuldades da vida.
Ailton Monteiro

6 . CREPÚSCULO DOS DEUSES | Billy Wilder – 9,55
“I am big, it’s the pictures that got small!”. A famosa frase é perfeita, mas incorreta quanto ao próprio filme, já que CREPÚSCULO DOS DEUSES é enorme, até por exalar Cinema por todos os seus poros. Billy Wilder, no auge da forma, com uma audácia de que só ele seria capaz, dirige (e ressuscita) Gloria Swanson, William Holden e Erich von Stroheim, que praticamente interpretam a si mesmos, e a Cecil B. de Mille, Hedda Hopper, Buster Keaton e cia., que realmente interpretam a si mesmos, com todos eles, claro, definitivos e únicos em seus papéis. Só Billy Wilder mesmo para conseguir fazer uma crítica ácida ao mundo hollywoodiano e, ao mesmo tempo, evocar em qualquer amante do Cinema uma grande saudade daquela época mágica. Afinal de contas, quem não gostaria de poder entrar naquela estranha mansão e assistir ao vivo ao último close-up para o Sr. de Mille?
Marcelo Rennó

5 . PSICOSE | Alfred Hitchcock – 9,56
PSICOSE é talvez o mais famoso filme do mestre do suspense, Alfred Hitchcock. Não é seu melhor, mas é certamente um de seus mais marcantes, coesos e ousados. Poucos são aqueles que têm coragem de matar sua protagonista com apenas 40 minutos de projeção e ainda imortalizar tal cena, com elementos intrigantes – uma trilha sonora que ficou para a história, movimentos sutis de câmera que culminam numa cara de horror e num grito perfurante, a conquista do âmago da personagem central ao adentrar no seu momento íntimo e a descoberta posterior -, e questionar outras maneiras de suspense. Hitchcock mitifica o hotel à beira da estrada e a personagem do psicopata – Norman Bates, o psicótico edipiano, fruto de uma visão de Freud que coloca o interior a frente do exterior -, a quem desvenda a alma e a loucura, causando sentimentos antagônicos e surpreendentes. Hitchcock é o que é porque reinventou o suspense. Quem se importa com quem é o culpado? Há muito mais por trás…
Gabriel Carneiro

4 . A TURBA | King Vidor – 9,58
A TURBA é um filme-presságio. O protagonista do filme é um ex-figurante, um ator que surge da multidão para estrelar um filme sobre quem está no meio da multidão. Um homem que se achava predestinado ao sucesso, mas que vê o fim de seu sonho, que é o sonho americano. King Vidor lança uma poderosa reflexão sobre a relação entre o homem e a cidade e parece perguntar o que é um no meio de um milhão.
Chico Fireman

3 . UM CORPO QUE CAI | Alfred Hitchcock – 9,61
Embora seja totalmente subjetivo considerar UM CORPO QUE CAI o “melhor filme de todos os tempos”, é fácil concordar com quem aposte nele como a obra-prima de Hitchcock. Tudo está tão bem encaixado na tela que você logo se sente hipnotizado pela jornada obsessiva do detetive John Ferguson em busca da verdade por trás da misteriosa Sra. Elster. O voyeurismo (sempre ele) guia o olhar do espectador e os interesses psicológicos e cinematográficos de Hitchcock por uma espiral de sonho, ilusão, medo e desejo.
Renato Silveira

2 . JANELA INDISCRETA | Alfred Hitchcock – 9,66
Em tempos de suspenses como PARANÓIA, refilmagem não assumida DE JANELA INDISCRETA é claro o talento de Alfred Hitchcock em transformar um roteiro simples (jornalista preso em cadeira de rodas cria o hábito de espionar os vizinhos até que suspeita que um deles cometeu um assassinato), num eficiente suspense onde o clima de tensão é desenvolvido de forma crescente, observe como somente temos a narrativa dos fatos pelos olhos do jornalista L.B. Jeffries (carismático James Stewart), preso em seu apartamento. Hitchcock consegue criar um mosaico de situações através da janela do jornalista, um verdadeiro voyeur, quarenta anos antes da geração Big Brother
Paulo Jr.

1 . A PALAVRA | Carl Theodor Dreyer – 9,72
Quando me pediram para escrever sobre A PALAVRA, não pensei duas vezes e aceitei. Mal sabia o quão difícil seria essa tarefa. Tenho dificuldade de falar sobre os filmes de que eu mais gosto, os realmente especiais. Além do mais, A PALAVRA mexe com um tema tão delicado e passível de ser esnobado pelos mais céticos e cínicos – que é a fé – que às vezes uma palavra com a intenção de beneficiar o filme pode ter efeito contrário. Por isso, fico com o lugar comum e digo que A PALAVRA é o melhor filme sobre a fé já realizado. E não importa muito se Borgen é ou não Jesus Cristo. O importante é crer para que o desejo se materialize.
Ailton Monteiro